Entre o som do coração e o silêncio do ecrã: mães denunciam falhas graves nas ecografias feitas na clínica
A clínica do Pinhal Novo que já havia sido acusada de não detetar malformações graves num feto, enfrenta agora novas denúncias. Desta vez, está em causa um caso em que o risco de trissomia 21 não foi devidamente identificado. Leonor nasceu saudável, mas a confirmação só chegou depois de ultrapassado o prazo legal para interrupção da gravidez em situações de doenças incuráveis, revelou esta terça-feira a SIC.![]() |
| Ecografias realizadas “a correr” levantam suspeitas sobre diagnósticos |
Leonor nasceu saudável. Sorri com a energia de quem já enfrentou o medo antes mesmo de vir ao mundo. Mas a história da sua mãe, Tânia Correia, é uma daquelas que deixa marcas invisíveis - as que ficam entre o som do coração do bebé e o silêncio de um ecrã de ecografia.
A Ceraque, clínica do Pinhal Novo, acusada por falhas na deteção de malformações graves num feto, volta agora a estar no centro de novas denúncias. Desta vez, um risco de trissomia 21 ignorado. Leonor escapou à doença, mas a certeza só chegou quando a lei já não permitia interromper a gravidez em caso de doenças incuráveis, revelou esta terça-feira a SIC.
Tânia recorda cada detalhe daquelas ecografias com a nitidez que só o susto deixa.
“Fiquei sempre com a sensação de que era tudo a correr. Não deixavam acompanhantes entrar, o médico não explicava o que estava a fazer”, contou, com voz calma mas firme.
Na altura, a clinica era a única opção disponível através do Serviço Nacional de Saúde na zona do Pinhal Novo. Ali fez as ecografias do primeiro e do segundo trimestre - exames fundamentais para detetar anomalias cromossómicas e malformações anatómicas. O resultado, em ambas as vezes, foi tranquilizador: “Está tudo bem”.
Mas o sossego terminou às 25 semanas. O acaso de perder a médica de família levou Tânia a ser acompanhada por um obstetra, e foi esse olhar mais atento que levantou dúvidas:
“A ecografia não estava bem feita”, disse-lhe o médico, ao perceber que as medidas registadas no relatório não coincidiam com as imagens.
Quando o tempo se esgota antes da certeza
A incerteza foi um golpe. “Lembro-me de chorar e dizer para a barriga: ‘a mãe ama-te na mesma’. Foram dias muito duros para processar”.
Durante uma semana, Tânia e o companheiro viveram suspensos entre o medo e a esperança. As novas ecografias afastaram o risco de trissomia 21, mas o alívio chegou tarde. Já depois de ultrapassado o prazo legal para interromper a gravidez.
Hoje, Leonor é uma criança cheia de energia, e a mãe olha para trás com um misto de gratidão e revolta. “Podia ter sido diferente. A falta de cuidado, de explicações, de tempo... isso pesa”, confessa.
A incerteza foi um golpe. “Lembro-me de chorar e dizer para a barriga: ‘a mãe ama-te na mesma’. Foram dias muito duros para processar”.
Durante uma semana, Tânia e o companheiro viveram suspensos entre o medo e a esperança. As novas ecografias afastaram o risco de trissomia 21, mas o alívio chegou tarde. Já depois de ultrapassado o prazo legal para interromper a gravidez.
Hoje, Leonor é uma criança cheia de energia, e a mãe olha para trás com um misto de gratidão e revolta. “Podia ter sido diferente. A falta de cuidado, de explicações, de tempo... isso pesa”, confessa.
Clínica volta a ser visada e autoridades já investigam
A Ceraque, procurada pela SIC, não respondeu às tentativas de entrevista. Por escrito, limitou-se a afirmar que não tem “poder de fiscalização sobre as ecografias realizadas” e que, “apesar dos avanços tecnológicos, há malformações que não podem ser detetadas”.
Quanto ao caso do bebé que nasceu com uma perna incompleta e apenas dois dedos no pé - também ligado à clínica -, a instituição diz que responderá “única e exclusivamente” ao Ministério Público, no processo que decorre no DIAP de Setúbal.
A Ceraque, procurada pela SIC, não respondeu às tentativas de entrevista. Por escrito, limitou-se a afirmar que não tem “poder de fiscalização sobre as ecografias realizadas” e que, “apesar dos avanços tecnológicos, há malformações que não podem ser detetadas”.
Quanto ao caso do bebé que nasceu com uma perna incompleta e apenas dois dedos no pé - também ligado à clínica -, a instituição diz que responderá “única e exclusivamente” ao Ministério Público, no processo que decorre no DIAP de Setúbal.
Reclamações em alta e regulação limitada
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| ERS confirma oito queixas sobre a clínica |
A ERS sublinha que as queixas “podem ou não envolver casos de negligência médica”, um conceito que considera “muito amplo” e difícil de estratificar. As reclamações são analisadas de acordo com critérios como a qualidade técnica dos cuidados prestados, a adequação dos procedimentos e o direito a um tratamento digno e humano.
O regulador lembra ainda que a sua atuação não se estende à regulação direta da atividade dos profissionais de saúde - competência que cabe às respetivas ordens profissionais. Quando há indícios de negligência, os casos são encaminhados para essas entidades e, se necessário, para o Ministério Público.
Ministério Público abre inquérito
O Correio da Manhã noticiou que o Ministério Público já abriu um inquérito à clínica do Pinhal Novo, onde foi realizada uma das ecografias sob suspeita.
A Ceraque respondeu afirmando que “todas as ecografias são realizadas por médicos especialistas” e que o relatório “não identificou qualquer anomalia visível”. Acrescentou que teve conhecimento do caso apenas através da comunicação social e que “nem os pais nem qualquer familiar” contactaram a unidade “formal ou informalmente”.
O Correio da Manhã noticiou que o Ministério Público já abriu um inquérito à clínica do Pinhal Novo, onde foi realizada uma das ecografias sob suspeita.
A Ceraque respondeu afirmando que “todas as ecografias são realizadas por médicos especialistas” e que o relatório “não identificou qualquer anomalia visível”. Acrescentou que teve conhecimento do caso apenas através da comunicação social e que “nem os pais nem qualquer familiar” contactaram a unidade “formal ou informalmente”.
Entre a ciência e a confiança
O caso de Leonor levanta uma questão que ultrapassa uma simples falha técnica. Fala-se de confiança - num sistema de saúde que deveria proteger, esclarecer e acompanhar.
A história podia ter terminado de outra forma. Desta vez, terminou com uma vida feliz. Mas, para muitas mães, a incerteza continua a ecoar no som do coração dos seus bebés e no silêncio das respostas que ainda faltam.
O caso de Leonor levanta uma questão que ultrapassa uma simples falha técnica. Fala-se de confiança - num sistema de saúde que deveria proteger, esclarecer e acompanhar.
A história podia ter terminado de outra forma. Desta vez, terminou com uma vida feliz. Mas, para muitas mães, a incerteza continua a ecoar no som do coração dos seus bebés e no silêncio das respostas que ainda faltam.
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