Setúbal exige “justiça” após morte de homem

Amigos do Fantasma querem 'justiça' após morte violenta

Um cartaz e uma folha A4 mostravam duas frases: "Contra a violência policial" e "Fantasma não esquecemos". Cerca de 150 pessoas desfilaram pelas ruas de Setúbal, no sábado, convictas de que Nuno Jorge Pires, também conhecido entre os amigos por Fantasma, terá morrido "vítima de uma agressão, com bastonada na cabeça" por parte de agentes de uma Equipa de Intervenção Rápida. Os manifestantes exigiram justiça face à morte de Nuno Jorge Pires, encontrado em coma numa rotunda perto da estação dos caminhos-de-ferro, a 19 de Fevereiro. Imagens de videovigilância da Estação mostram dois polícias junto à vítima, que foi depois encontrado caído por elementos do INEM que por ali passavam. A manifestação percorreu a Praça do Brasil e passou pelo local onde o homem de 35 anos foi encontrado. Muitos deixaram mensagens e velas. "Deixamos saudade e, sobretudo, apelamos para que este caso não seja esquecido", disse uma amiga do homem que perdeu a vida quando se dirigia para casa a pé. Recorde-se que este caso está ser investigado por três entidades (Polícia Judiciária de Setúbal, PSP e Inspeção-Geral da Administração Interna). 
Amigos querem justiça pela morte de Nuno Jorge Pires em Setúbal 

A manifestação que na tarde de sábado juntou os amigos de Nuno Jorge Pires começou com um recado para a justiça: "Não vamos deixar que a morte do Fantasma [- como era conhecido em Setúbal -] seja silenciada. Queremos saber porque lhe bateram e o deixaram ali sem apoio". A convicção dos amigos do homem de 35 anos que morreu na madrugada de 19 de Fevereiro é que este foi morto por uma bastonada na cabeça.
A vítima foi vista a ser abordada por agentes da Brigada de Intervenção Rápida da PSP através do sistema de videovigilância da estação dos comboios, como reconheceu a própria polícia, mas as imagens não mostram nenhuma agressão.
No final de uma marcha a pé, onde não terá estado ninguém da família da vítima, os amigos deixaram mais um recado: "Se não houver notícias no prazo de duas semanas voltaremos a sair à rua. Não pensem que isto vai acabar".
A vigília pacífica que começou na praça do Brasil - em frente à estação de comboios - juntou cerca de centena e meia de amigos de "Fantasma", acompanhados por agentes da PSP, que regularam o trânsito durante a marcha a pé. Os manifestantes percorreram os cerca de 500 metros que o soldador e DJ nos tempos livres iria realizar até casa na fatídica madrugada, embora a sua caminhada tenha terminado na rua da Tebaida, onde foi encontrado deitado no passeio e em coma por uma equipa do INEM.
Foi ali que os amigos depositaram velas e flores, acompanhadas de uma tarja com um imenso "Não esquecemos". Numa rotunda mais atrás, uma primeira faixa perguntava "Porquê?", enquanto no edifício onde a vítima residia se garantia que "Somos todos Fantasma".
"Cá por dentro todos sabemos o que se passou. Queremos justiça. Queremos uma resposta para esta morte", reclamava Carlos Silva, antes de um minuto de silêncio seguido de um coro de palmas e das duas principais palavras de ordem: "Fantasma, amigo, Setúbal está contigo", além de "justiça, justiça, justiça".
Amélia Ferreira, amiga de Nuno Jorge Pires do tempo de escola, admitia "ainda estar incrédula" com o que se passou, garantindo que "o Fantasma era uma pessoa espetacular". "Quem é pode ter feito mal a uma pessoa que nunca fez mal a ninguém?", questionava.
Junto ao local onde Nuno foi socorrido pelos médicos do INEM, Daniela Pereira, uma das amigas do soldador, depositou uma flor e uma lágrima. "Deixamos aqui a saudade e, sobretudo, apelamos para que este caso não seja esquecido", realça a mulher de 33 amos. "Aqui não estamos contra a polícia, nem queremos acusa-los de ânimo leve. A Polícia Judiciária e a PSP estão a investigar e apelo a que cheguem a uma conclusão e levem os culpados a julgamento. É só isso que queremos", concluiu Daniela Pereira.

"Voltarmos atrás 50 anos" 
“O que me traz aqui é tentar perceber até que ponto a nossa política nos leva a voltarmos atrás 50 anos. Não compreendo. Venho aqui dar a minha manifestação de pesar a um amigo, a um amigo do nosso filho e a um amigo nosso também”, disse à Lusa Francisco Praia, de 63 anos, um dos manifestantes que desfilaram da Praça do Brasil até à residência de Nuno Jorge Pires.
“Não sei quem matou o Jorge Pires. Há testemunhas e há testemunhos que se retraem, com medo de retaliações”, acrescentou Francisco Praia.
Patrícia Amâncio, amiga de Nuno Jorge Pires, de 35 anos, conhecido pela alcunha “Fantasma”, também desconhece as circunstâncias da morte do setubalense.
“Era amiga dele. Ele era uma pessoa espectacular, não criava conflitos com ninguém. Não posso estar a criar ideias porque ele estava sozinho naquele momento. Não sabemos o que aconteceu, mas esperamos que a justiça seja efectivamente justa e que se apure aquilo que aconteceu”, disse Patrícia Amâncio.

Administração Interna quer saber o que se passou 
A agência Lusa contactou diversos elementos da organização da manifestação, que decorreu sem incidentes, mas nenhum se mostrou disponível para prestar declarações, para além das palavras de ordem que foram gritando. Pediam “justiça”.
O caso continua a ser investigado pela Polícia Judiciária de Setúbal, que em breve deverá interrogar os agentes que estiveram de serviço na noite de 19 de Fevereiro, sendo dois deles vistos a abordarem Nuno Jorge Pires através de um sistema de videovigilância. As imagens não mostram qualquer tipo de agressão, segundo a própria PSP, que também já abriu um processo de averiguações para tentar apurar os contornos da intervenção policial e identificar quem esteve de serviço nessa noite, segundo o porta-voz da polícia, Paulo Flor. “Por existirem indícios consubstanciados em imagens [de videovigilância] que identificam dois polícias junto ao rapaz que veio a falecer, naturalmente que temos todo o interesse em perceber o que se passou”, acrescentou. A própria Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) decidiu instaurar um inquérito.
Recorde-se que a lesão que a vítima apresentava na cabeça, segundo a autópsia, pode ser compatível com uma bastonada, embora as normas internas da PSP impeçam de atingir esta zona do corpo. O homem viria a ser encontrado deitado no chão e já em coma pelo INEM na rua da Tebaida, acabando por morrer dois dias depois,  no Hospital Garcia de Orta, em Almada para onde foi transportado depois de ser assistido no Hospital de São Bernardo, em Setúbal.

Agência de Notícias



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