O "último refugio", uma história de um sequestro único em Portugal que marcou Pinhal Novo
GNR, após várias tentativas de diálogo, acabou entrar no restaurante |
Quatro mil quilómetros, oito países e 28 anos separam
Bruno Chainho e Mihail Codja. Mas no caminho que os leva a ganhar a vida, fazem
do Pinhal Novo o mesmo apeadeiro. O último refúgio onde ambos acabam por perder
a vida.
Bruno nasceu em 1982, num Alentejo que ainda não era
Europa. Numa época em que a Rússia ainda não era Rússia e a Moldávia ainda era
Soviética, Mihail tinha nesta altura 28 anos. Já tinha ido à guerra, já tinha
feito escola.
Mihail fez a primeira vida em Etulia, uma pequena
localidade no sul da Moldávia: a região mais pobre do país mais pobre da
europa. Tinha quatro irmãos e uma mão cheia de nada. Depois de oito anos de
escola, todos desaguavam na unidade agrícola de Etulia. Mihail fazia a ordenha
das vacas, a aldeia fazia o comunismo de Karl Marx.
Casou, trabalhou na capital do país, como motorista de
autocarro e fez serviço militar no exército soviético.
Já Bruno, alentejano, sonhador, filho único, quis ser
militar muito antes de querer ser gente. Do monte para a escola, na aldeia de
Santo André, e da escola da aldeia para uma verdadeira escola de vida.
Bruno Chainho tinha 19 anos quando em 2002 entra nos
fuzileiros. E aqui, pela primeira vez, jura dar a vida pela pátria.
Já as portas da Moldávia estavam abertas ao mundo
quando em 1999 Mihail Codja aponta destino a Portugal. O agora imigrante
moldavo começa a trabalhar como pintor para um empreiteiro do Pinhal Novo.
Havia dinheiro, havia trabalho, poucos sorrisos e
ainda menos amigos.
Em 2007, Bruno sai do batalhão de fuzileiros número
um, onde deixa amigos e um sonho a meio caminho. Sem canudo, sem estudos mas
com coragem e determinação, Bruno não desiste de ser militar. Em 2011 entra na
Guarda Nacional Republicana.
Vestido para a sua última missão, a 23 de Novembro de
2013 Mihail de Etulia, Miguel do Pinhal Novo, dirigiu-se ao restaurante que há
anos tinha ajudado a construir e entrou onde não voltou a sair.
Os
últimos momentos
Militares da GNR cercaram toda a área durante toda a madrugada |
Eram 22 horas: “O refúgio” estava quase vazio. Os
proprietários preparavam-se para fechar e mal sabiam que o restaurante não
voltaria a abrir. Apesar dos testemunhos, das evidências e das declarações que
constam no relatório tático-policial da GNR, a origem das armas tem várias
versões.
As granadas, tal como a pistola, são de fabrico
soviético. E podem ter sido trazidas para Portugal na única viagem de carro à
Moldávia feita por Mihail em 2010. De acordo com a família, Mihail nunca esteve
no Afeganistão, mas sim na guerra do Cazaquistão e terá sido de lá que trouxe
pelo menos uma arma.
Bruno Chainho avança, porque era o mais velho da
patrulha. Porque Bruno não tinha medo. E assim foi. Bruno tem morte imediata,
mas naquela noite ainda ninguém sabia disso.
Ao todo, 135 militares da Guarda estiveram envolvidos
na resolução. Dino Ferreira foi a última pessoa a falar com Mihail. Era o seu
melhor amigo. E nem ele tem as explicações que a razão desconhece.
O contrato de empreitada de maio de 2006, entre o dono
do restaurante, Gaspar Veloso, e o patrão de Miguel, Alfredo Moreira, indica um
valor de 46 mil euros que ambas as partes garantem ter sido pago.
Depois de cerca de 10 anos a trabalhar como pintor da
construção civil, o imigrante tinha sido dispensado da empresa de Alfredo
Moreira: Mihail passa a receber cerca de 400 euros do subsídio de desemprego,
mas poderia ter recebido mais do ex-patrão.
Nos últimos tempos a falta de dinheiro de Mihail
estava aos olhos de todos, mesmo que ninguém tenha visto. Passou a viver numa
garagem e dormia dentro do carro.
No total Mihail fez 10 disparos da makarov e 4 da
glock que tirou ao militar da GNR. Matou um cão da guarda e feriu outro. Foi
atingido por 3 disparos. Morreu como um soldado, sem dar tréguas, com as duas
armas nas mãos.
O corpo de Bruno Chainho só foi resgatado de
madrugada. O militar estava morto há várias horas. Tinha 31 anos. Em tão curta
vida jurou duas vezes dar a vida pelo país. Morreu para salvar quatro
portugueses.
O corpo de Mihail foi cremado e regressou de onde
partiu, Etulia, Moldávia. Bruno Chainho foi sepultado em Santo André, concelho
de Santiago do Cacém, onde cresceu, viveu e sonhou salvar pessoas. A família
ainda espera por uma indeminização do estado português. O Restaurante “O Refúgio”
fechou para nunca mais abrir. O Pinhal Novo, terra de sossego, jamais esquecerá
aquela noite de desassossego de uma madrugada fria de Novembro.
Assista AQUI à reportagem da TVI que conta como tudo
aconteceu em Pinhal Novo. Notícias relacionadas:
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Agência de Notícias
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