Um Pingo de quê?


Impressões Digitais by Paulo Jorge Oliveira 


Um Pingo de quê?

Os impostos tornam as economias mais ou menos competitivas. Se um país tem maior carga fiscal, logo haverá menos investimento e mais fugas de capital. E não é preciso ser-se economista para fazer estas contas de cabeça. Até parece um cliché. Mas não é. Como se vê pela saída da Jerónimo Martins e de outras empresas que se lhe seguirão. Fora as que não vêm para Portugal, precisamente por causa dos "ónus" que não podem, ou não querem, suportar: um empresário é alguém que aplica capital em troca de certo retorno. Se as condições do sítio onde investiu prejudicam esse retorno, vai para onde lhe derem mais vantagens. Sempre foi assim. E sempre vai ser.


Voltemos à Jerónimo Martins. O grupo diz que mudou para estar num mercado sem problemas de financiamento, mas é indiscutível que a questão fiscal pesou na decisão. Até porque Portugal não é um modelo de estabilidade fiscal: o que é hoje, amanhã deixa de o ser. Mas as críticas que se levantaram, nomeadamente nas redes sociais, falham o alvo. São um ataque ao mensageiro... não ao verdadeiro culpado: o Estado, que por gastar demais, exagera nos impostos. E o resultado? Afasta investimentos.
Estamos saturados de manhosos, desconfiados de moralistas, estamos sem ídolos, sem heróis, estamos encandeados pelos faróis dos que saltam para o lado do bem para escapar à turba contra o mal. Quando apanhamos, abocanhamos. Estraçalhamos. Somos uma multidão furiosa. Às vezes, erramos. A família Soares dos Santos (que controla a Jerónimo Martins) não está a fugir aos impostos. Mas está a fugir do país e a abrir portas a que outros partam em debanada.
Só há um antídoto contra a especulação: a informação. É assustador ver tanta opinião instantânea sobre o que se desconhece. A sede de vingança tomou o lugar da fome de justiça. O problema não está na rua, nas redes sociais, nas esquinas dos desempregados. Está em quem tem a obrigação de saber do que fala. Do Parlamento, de Ana Gomes, de António Capucho, dos que pedem boicotes ao Pingo Doce (para comprar onde, já agora? No Continente da Sonae que tem praças na Holanda? No Lidl, que as tem na Alemanha?).
Aqueles que se escandalizaram deviam ter-se comovido também quando, há um par de meses a Jerónimo Martins anunciou como iria investir 800 milhões de euros em 2012: 400 milhões da Colômbia, 300 na Polónia... e 100 milhões em Portugal. Isto sim, é sair de Portugal. E quando a Jerónimo investir na Colômbia, provavelmente vai fazê-lo também através da Holanda, onde se paga menos. Estes são problemas diferentes dos que foram enunciados: a falta de atracção de investimento de Portugal; e a instabilidade fiscal, que muda leis como quem muda de camisa, afastando o capital.
O que custa a engolir não é que os donos do Pingo Doce tenham cortado o passado com Portugal, esse mantém-no e continua a pagar impostos. É que tenha cortado o futuro. É que tenha decidido investir fora daqui porque aqui não tem por onde crescer, para procurar lucros fora de Portugal, criar postos de trabalho fora de Portugal e, então sim, pagar impostos desse futuro fora de Portugal. Pensando bem, esse é um grande problema e é um problema nosso. Mas investir fora do País não é traição. É apenas desistir dele. E a Jerónimo já partiu para a Polónia há muitos, muitos anos - ou ninguém reparou? Mas isto ninguém discute, ninguém se interessa sequer. Ninguém, da esquerda arreliada à direita paralisada, discute o futuro.
É aborrecido ver um grupo nacional, que diz apoiar produtores portugueses, sair do país? É. Mas não o podemos condenar. Porque a função da gestão é maximizar o retorno dos investidores. E se os "indignados" estão realmente indignados, têm boa solução: obriguem o Estado a gastar menos. Só assim poderemos ter carga fiscal mais baixa e menos problemas de financiamento.
Assim, com este estado de coisas e de impostos, a Jerónimo Martins faz exactamente o que diz o slogan do Pingo Doce: “Sabe bem pagar tão pouco”!  









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