Adeptos do Vitória juntos em protesto esta tarde em Setúbal

Expulsão do clube das ligas profissionais gera onda de apoio e gritam: "Liga quer matar o futebol"

A nação vitoriana prepara-se para voltar a sair à rua em mais uma onda de apoio ao clube da cidade. Esta segunda-feira, os adeptos do Vitória e os setubalenses vão concentrar-se na Praça do Bocage para vincar a força do clube e mostrar, quer à Liga quer ao resto do país, a "grandeza do Enorme e a fibra da cidade", capital de distrito. O apelo para a concentração foi lançado através da rede social Facebook e já no sábado mais de 200 adeptos levaram a efeito manifestações de apoio ao clube naquela mesma praça. Foi cumprido o distanciamento social e além de o hino do clube ser cantado a uma só voz, ouviram-se outras mensagens, como a de que a "Liga quer matar o futebol". Em todos os adeptos há a esperança de que o recurso para Conselho de Justiça da FPF evite a descida e ao campeonato de Portugal. Uma coisa parece comprovada. A Liga ainda não "teve a coragem" de mostrar "as provas contra o clube" nem tão pouco explicar, com factos provados, a tomada desta decisão pela Comissão de Auditoria da Liga Portuguesa de Futebol Profissional.
Adeptos protestam em Setúbal 

De acordo com a decisão, o clube sadino não conseguiu apresentar prova de “inexistência de dívidas a sociedades desportivas”, a “inexistência de dívidas a jogadores, treinadores e funcionários”, assim como “a regularidade da situação contributiva perante a Autoridade Tributária”. No entanto, e indo a factos, nada disto foi ainda exposto e explicado ao público.
Paulo Gomes, presidente clube, que participou na Assembleia Geral da Liga, no Porto, confirmou que esta segunda-feira o Vitória de Setúbal vai apresentar o seu recurso e mostrou-se "confiante" que a normalidade voltará ao clube que até já contratou novo treinador este domingo.
"Para os pontos que disseram que não cumprimos, temos fundamentação legal para se sobrepor. Já tivemos acesso ao registo da Comissão de Auditoria e continuamos na luta pela defesa de um clube centenário, que defende uma cidade de gente de trabalho e honesta", disse Paulo Gomes.
O presidente dos sadinos lembrou que a redução do tempo da janela de transferências, devido à pandemia de covid-19, retirou espaço para que o orçamento da sociedade desportiva pudesse ser totalmente cumprido, causando dificuldades acrescida para corresponder a todos os pressupostos do licenciamento.
"Tivemos de entregar os pressupostos no decorrer do campeonato, o que diminuiu as nossas hipóteses [de receitas] e com a agravante do estado de calamidade que se vive em Setúbal, que legalmente não nos permite fazer coisas que se fazem no resto do país. Essas pequenas diferenças, fazem com que alguns pressupostos não fossem cumpridos, mas não por falta de garantias, porque essas foram dadas", disse o dirigente.
Paulo Gomes confessou que "os adeptos estão preocupados, mas estão unidos" e não deixou de lançar algumas críticas à forma como a Liga conduziu este processo, criticando a postura e a "falta de solidariedade" de alguns emblemas - ditos de primeira - e aconselhando o responsável pela Liga, Pedro Proença, "a ter outra postura", na condução deste processo.

Setubalenses temem pelo futuro do Vitória
Depois de há uma semana milhares de pessoas terem saído à rua para apoiar a equipa e, após o triunfo 2-0 sobre o Belenenses SAD, festejar a permanência, os adeptos estavam longe de imaginar que a Comissão de Auditoria da Liga Portuguesa de Futebol Profissional iria reprovar os processos de licenciamento e decretar a descida ao Campeonato de Portugal.
À entrada do Mercado do Livramento, ponto de encontro diário de milhares de sadinos, Joaquim Cruz, 49 anos, não escondeu preocupação pelo momento atual e confessa que a sua tristeza é proporcional à que sentiu na janela do prédio onde vive junto ao estádio do Bonfim há poucos dias.
"No domingo houve festa toda a noite e hoje parece que a cidade está a viver um pesadelo. Custa-me a acreditar que o Vitória desça de divisão na secretaria. Seria difícil, mas aceitava melhor se fosse por ter perdido o jogo", disse.
O comerciante setubalense considera que enquanto o processo decorre é cedo para apontar responsáveis pelo momento atual, mas entende que a situação podia ter sido evitada se toda a documentação necessária tivesse sido entregue
"Diz-se que faltam uns papéis. Todos os anos o Vitória é falado por coisas deste género. Por esse motivo, quem dirige o clube deveria estar precavido de forma a impedir que esta história se repita época após época", vincou.
No lado oposto da Avenida Luísa Todi, junto à Praça de Bocage, Manuel Serra, 72 anos, deambula pensativo até ser abordado para falar do clube da cidade.
"Não me diga nada! Quando vi na televisão que o Vitória ia descer nem queria acreditar. Não acredito. O clube tem dificuldades e isso não é de agora. Como em anos anteriores, espero que seja mais um susto", referiu.
O reformado alentejano, residente em Setúbal há mais de 60 anos, afirma que nos anos mais recentes tem sido recorrente sofrer-se pelo Vitória e revela receio pelos efeitos de uma descida ao Campeonato de Portugal.
"Nos últimos anos são mais as vezes que o Vitória sofre do que está tranquilo na classificação. Se o clube tem dificuldades na I Liga, é fácil imaginar o que seria na terceira divisão em que as receitas são menores", disse.
Ana Filomena, de 29 anos, na Praça do Bocage aponta o dedo à Liga e à FPF, lembrando os casos de Sporting e FC Porto. "O Sporting, perante a reestruturação da sua divida à banca, teve alguns apoios que não são permitidos a outros clubes, nem a ninguém", lembra a jovem sadina. "O clube tem dívidas gigantes, não paga treinadores [a dívida de Rúben Amorim vai já em 14 milhões], não pagam a outro treinador, indo contra uma decisão do tribunal, devem jogadores, devem a fornecedores e para a comissão de auditoria está tudo bem. E a FPF, entidade pública,  que faz perante esse cenário? A equipa B do Sporting vai militar no Campeonato de Portugal na próxima temporada. Uma decisão que tem por base o 'mérito desportivo'. Recorde-se que o Sporting teve equipa B durante seis temporadas. Porém, em 2017/18, a presidência de Bruno de Carvalho decidiu não continuar com a equipa na temporada seguinte. Logo, para voltar teria ser nos distritais, é isso que diz a lei. Assim, deturpam a competição, só para promoverem os amigos. A mesma lei que é cega para os grandes e vê tudo em clubes mais pequenos", conta a adpeta. E lembrou a atitude da UEFA que "aprovou uma série de medidas temporárias de emergência numa resposta aos efeitos da pandemia do covid-19 que nas finanças dos clubes. Entre essas medidas está o adiamento aos Regulamentos de Licenciamento de Clubes e Fair Play Financeiro. Destaca-se o adiamento da avaliação do exercício de 2020, que será realizada em conjunto com o exercício de 2021, com a UEFA a alertar para o objetivo que será abordar o verdadeiro problema que é a quebra de receitas devido à covid-19 e não devido a uma má gestão financeira. Decisão que faz que o FC Porto possa ir este ano à Liga dos Campeões, sem esse apoio não ia". Ana Filomena foi mais longe: "Será Portugal capaz de fazer isso? Faz, que em causa tiver clubes da moda e clubes grandes e é isso que destrói a tão falada 'verdade desportiva', que só é aplicável a quem convém".
Além do Vitória de Setúbal, a Liga excluiu também das provas profissionais o Desportivo das Aves, que tinha sido despromovido à II Liga, depois de ter terminado a I Liga na 18.ª e última posição, enquanto os setubalenses tinham assegurado a permanência, ao ser 16.º.
A Liga de clubes convidou o Portimonense, que tinha sido 17.º posicionado e despromovido, a manter-se na I Liga e o Cova da Piedade [que nem estádio tem, segundo o clube] e o Casa Pia [que já pediu prudência] a manterem-se na II Liga, depois de terem sido despromovidos administrativamente, com o cancelamento do segundo escalão, devido à covid-19. À I Liga subiram ainda - por convite após o cancelamento abrupto da competição - o Nacional da Madeira e o Sporting Farense que cumpriram pouco mais do que meio campeonato.

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