Editorial


A crise chega às autarquias

O Orçamento Participativo, antes uma bandeira da Câmara de Palmela,  mostrou o obvio: a Câmara não tem dinheiro para investir. E as poucas obras que vão ser feitas acontecem com recurso a apoio a empréstimos bancários. E as pessoas parecem encolher os ombros. Quem perdeu a noite para assistir às reuniões participadas, gastou o tempo a falar do problema do esgoto da rua, o mau cheiro perto da casa, o barulho que perturba o sono. São problemas importantes para as pessoas mas que, na essência, não servem para a contribuir para a construção de um orçamento municipal. É a prova de que os munícipes já  não acreditam  nos políticos. Sejam de âmbito local ou seja de círculos nacionais.
Hoje, em Portugal, as autarquias gastam muito dinheiro mal gasto e é urgente pôr ordem no poder político local. Basta ver a reportagem desta semana, no Expresso, em que 100 das 308 autarquias estão em “asfixia financeira”. Na verdade sempre foi assim e nunca se fez nada. Em anos de vacas gordas e de forte investimento na construção civil, construíram-se cidades dormitório. Sem condições, sem espaços verdes, sem planeamento, sem se pensar na década seguinte. As autarquias de várias cores políticas encheram “os cofres” e gastaram em pessoal, obra aqui e ali e, sobretudo, em planos de pormenor para requalificar centros urbanos que, afinal de contas, não servem as populações.
É óbvio que os exemplos vêm de cima, e a administração central é tudo menos um bom exemplo. É, aliás, um péssimo exemplo. Trinta e seis anos depois da madrugada de Abril, é confrangedor que o país tenha chegado a este estado de agonia e que o Governo da nação nos venha agora com um orçamento de “salvação nacional” para endireitar aquilo que fizeram mal. Ou me engano muito, ou qualquer dia – há cada vez mais portugueses a fazê-lo, sobretudo nas zonas fronteiriças – começamos a rumar em direcção aos supermercados de Espanha, porque o vento está muito mais moderado.
Mas, concentrando-nos no poder político local que está investido nos municípios portugueses – há autarcas em funções há mais de um quarto de século e forças políticas que nunca saíram do poder desde as eleições democráticas  –, é certo que até 2013 [ano das próximas autárquica] vão ser anos que porá à prova a capacidade de gestão dos autarcas portugueses, que se tem pautado por uma enorme falta de sensatez financeira.
No país em que continua a haver partidos políticos a pagar as quotas dos militantes para captar os seus votos, os vícios transferem-se para os corredores das autarquias e gere-se a “coisa pública” ao sabor do voto.
Enquanto vários milhões de portugueses continuam a empobrecer alegremente, todos nós vemos por aí autarcas, de todas as cores políticas, a esbanjar “milhares de euros” em rotundas, nesse desporto nacional chamado fogo de artifício, em mordomias, em “gente” contratada que nem sequer ousa pensar pela sua própria cabeça, e em obras cuja relação custo/benefício não faz parte do cálculo.
Sabendo-se que com o próximo Orçamento os municípios vão sofrer grandes cortes financeiros, talvez seja esta a altura para aplicar aquele célebre ditado que diz que “a necessidade aguça o engenho”. Em Palmela, por exemplo, a autarquia já sabe que o seu orçamento é de 40 milhões, que do Estado não vai chegar um “tostão”, que as receitas dos impostos municipais está a decair a pique e há, claramente, uma retracção nos investimentos previstos. E com tudo isso só há uma coisa a fazer: começar rapidamente a reduzir a sua factura das despesas. E numa câmara onde os gastos com o pessoal são metade do seu orçamento, há que ter coragem política para intervir.
O que também é preciso é ideias e imaginação, porque as novas tecnologias – há Velhos do Restelo a não quererem entender isso – são actualmente um dos nossos principais aliados para a prática de uma gestão mais verde e com muito menos desperdícios.
Hoje, num país que gasta anualmente 150 milhões de euros em iluminação pública [Palmela, gasta quase 1 milhão] a uma empresa como a EDP, há programas de eficiência energética a que importa aderir rapidamente. No fim de um ano, poupa-se muito dinheiro. Este é só um pequeníssimo exemplo, mas como dizem os antigos “quem não poupa água e lenha, não poupa nada que tenha”.


Paulo Jorge Oliveira 

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