Há 1700 mariscadores ilegais entre a Trafaria e Alcochete

PS Setúbal questionam governo sobre apanha ilegal de amêijoa

Todos os dias, quando a maré baixa, centenas de pessoas entram Tejo adentro entre a Trafaria e Alcochete. Munidos de sachos, ancinhos, facas de mariscar ou mesmo enxadas, famílias inteiras, homens, mulheres e crianças, andam quilómetros para escavar o lodo. Buscam todo o género de bivalves, mas especialmente amêijoa-japonesa. Para muitos, esta actividade ilegal é o único sustento. Mas há também um circuito organizado de intermediários que compram a amêijoa a estes mariscadores a preços irrisórios para a levar para o mercado espanhol, onde a procura é grande, ou para a passar para o mercado nacional. Tudo de forma ilegal. Os deputados socialistas, eleitos pelo distrito de Setúbal, querem regularizar esta atividade e já questionaram o Governo sobre o assunto. 
Deputados socialistas querem regularizar apanha de amêijoa 

Os deputados do PS eleitos por Setúbal questionaram o governo sobre a apanha ilegal de amêijoa no estuário do Tejo, referindo que existem quase dois milhares de mariscadores em situação irregular. “Diariamente largas centenas de pessoas entram Tejo adentro entre a Trafaria e Alcochete à procura de todo o tipo de bivalves, especialmente de amêijoa-japonesa. Estima-se que sejam cerca de 1700 os apanhadores de amêijoa-japonesa no estuário do Tejo, a maioria deles em situação irregular”, referem os deputados em comunicado.
Os deputados do PS salientam, no documento, que a ameijoa-japonesa, sendo uma espécie invasora, é importante que seja apanhada, mas de modo regulado.
“Apreciações já efectuadas indicam que grande parte das capturas não é registada em lota e entram ilegalmente no circuito comercial nacional. O circuito organizado de intermediários passa pela compra da amêijoa aos mariscadores, a preços irrisórios, e entra no mercado nacional, bem como no mercado espanhol, com grande procura, de forma ilegal”, explicam os deputados socialistas em comunicado. Os deputados defendem que a actividade “movimenta anualmente milhões de euros”.
“Acreditasse que a maioria destes bivalves chegam à mesa dos consumidores sem passarem pelos procedimentos adequados, podendo estarem contaminados por toxinas ou metais pesados”, disse Eurídice Pereira, coordenadora dos deputados do PS, eleitos por Setúbal
Os deputados questionam o governo, através do Ministério do Mar, se existe intenção de elaborar um plano estratégico de apoio à gestão da apanha da ameijoa-japonesa do estuário do Tejo, se está pensada alguma alteração à regulamentação em vigor e que quantidade se estima que foi apanhada e apreendida.
Querem ainda saber "qual o número limite de licenças para mariscadores no estuário do Tejo e quantas se encontram atribuídas" e se foi feito algum contacto para a “implementação de uma unidade industrial, ao que parece inexistente em Portugal, que atue sobre a transformação industrial de bivalves”, conclui a nota do PS.

Negócio rende milhões de euros 
Muitos destes bivalves que chegam ao prato dos portugueses não passam por qualquer análise, tratamento ou depuração e podem estar contaminados com toxinas e até metais pesados, levantando um grave problema de saúde pública. Existem também impactos ambientais negativos, causados especialmente pela captura com uma técnica de arrasto: ganchorras atreladas a barcos (aparelhos com uma espécie de lâminas que rasgam o fundo do rio), por mergulho, ou uso de berbigoeiros, uma arte que revolve o solo do Tejo de forma manual.
A apanha de bivalves está totalmente proibida no estuário do Tejo “devido à presença de fitoplâncton produtor de toxinas marinhas ou de níveis de toxinas ou de contaminação microbiológica acima dos valores regulamentares”, segundo informa o Instituto Português do Mar e da Atmosfera.
Um estudo científico que reuniu os departamentos de investigação de várias universidades, realizado entre Janeiro e Dezembro do ano passado, revela existirem mais de 1700 mariscadores, cerca de 1500 ilegais, que retiram do estuário do Tejo a maioria dos 19 mil quilos de amêijoa-japonesa por dia (dez mil pelos aparelhos de arrasto) num negócio na sua larga parte pirata que, em 2014, terá envolvido uma verba estimada entre os 10 e os 23 milhões de euros.
Se se tiver em conta que os 182 apanhadores legais licenciados em 2014 registaram em lota nesse ano um valor de cerca 1,6 toneladas por dia e as apreensões feitas pela GNR nos primeiros quatro meses deste ano (58 toneladas a nível nacional), percebe-se melhor a dimensão desta actividade completamente desregulada.

Governo quer resolver problema com as autarquias 
Há cerca de 1700 mariscadores ilegais no Tejo 
Autarcas da região do estuário falam de um “problema gravíssimo, assustador, dramático” e com “graves 
consequências para a saúde pública e ambiente”. Dizem-se de “mãos atadas” por não terem poderes para a resolução do caso e já apelaram a diversos ministérios, dizendo estar “totalmente disponíveis para colaborar”. “É um problema que toda a gente conhece, mas que poucos querem resolver”, diz Luís Miguel Franco, presidente da Câmara de Alcochete.
O tema também já foi abordado entre a Câmara do Montijo e o secretário-geral das Pescas, "no sentido da legalização da atividade e da garantia de saúde pública dos consumidores". Um assunto, refere a autarquia do Montijo, "negligenciado durante anos pelo anterior Governo, e que mais uma vez a Câmara Municipal chama a atenção para a necessidade de centrar as opções políticas nas questões em que verdadeiramente está em causa o nosso destino coletivo", sublinhou Nuno Canta, presidente da autarquia.
O Ministério do Mar disse ao jornal Público que “os diferentes contornos do problema e a natureza inorgânica dos apanhadores, que agem a título individual, sem qualquer estrutura ou organização de enquadramento, exigem que a resposta a dar ao problema seja pensada de forma integrada”.  
O Instituto Português do Mar e da Atmosfera, escreve o Público, “continuará o seu programa de acompanhamento e monitorização da qualidade das águas e as autoridades fiscalizadoras mantém a pressão no combate às ilegalidades”, mas reconhece que "estes dois factores não bastam”. O ministério aponta para a necessidade de “um plano de gestão integrado” que o Governo irá “desenvolver com as autarquias e outros parceiros locais para criar condições para a regulamentação da apanha no estuário do Tejo”.

Agência de Notícias 

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