Reticências da Sociedade por Ana Sofia Horta


Poema à Mãe

Porque o dia da mãe ainda decorre no nosso mundo e não deixei nada sobre esse dia. Não há amor maior que amor entre filho e mãe!



No mais fundo de ti, 
eu sei que traí, mãe 

Tudo porque já não sou 
o retrato adormecido 
no fundo dos teus olhos. 

Tudo porque tu ignoras 
que há leitos onde o frio não se demora 
e noites rumorosas de águas matinais. 

Por isso, às vezes, as palavras que te digo 
são duras, mãe, 
e o nosso amor é infeliz. 

Tudo porque perdi as rosas brancas 
que apertava junto ao coração 
no retrato da moldura. 

Se soubesses como ainda amo as rosas, 
talvez não enchesses as horas de pesadelos. 

Mas tu esqueceste muita coisa; 
esqueceste que as minhas pernas cresceram, 
que todo o meu corpo cresceu, 
e até o meu coração 
ficou enorme, mãe! 

Olha — queres ouvir-me? — 
às vezes ainda sou o menino 
que adormeceu nos teus olhos; 

ainda aperto contra o coração 
rosas tão brancas 
como as que tens na moldura; 

ainda oiço a tua voz: 
          Era uma vez uma princesa 
          no meio de um laranjal... 

Mas — tu sabes — a noite é enorme, 
e todo o meu corpo cresceu. 
Eu saí da moldura, 
dei às aves os meus olhos a beber, 

Não me esqueci de nada, mãe. 
Guardo a tua voz dentro de mim. 
E deixo-te as rosas. 

Boa noite. Eu vou com as aves. 

Eugénio de Andrade, in "Os Amantes Sem Dinheiro"



Porque afinal crescemos, a personalidade teima em poisar e afinar, e por vezes o amor da mãe faz tanta falta mas a barreira da personalidade é maior. Eu adoro mimos da minha mãe mesmo que forçados, porque sei que de uma forma ou outra ela estará sempre para mim.
 As mães serão sempre mães e os filhos sempre filhos, seja mãe de sangue ou coração, é um amor sem descrição, amor eterno, dorido, em que as palavras ferem como ferro queimado, sendo palavras que às vezes voam em vão e despistam-se magoando.



Ana Sofia Silva Horta 
Educadora de Infância no Desemprego 
Oeiras 


O terceiro dia semana tem sempre uma reticência. O mundo pula e avança mas, à Terça-feira, Ana Sofia Horta chega ao ADN com uma história de vida ou uma estória pessoal. Uma visão muito pessoal e uma opinião muito real da sociedade. Para ler, saborear, pensar e analisar. 

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