Em Reportagem: Os cães selvagens da Arrábida

Cães selvagens da Arrábida em... tribunal


O Clube da Arrábida meteu, na terça-feira, no Tribunal de Almada uma acção popular contra a Câmara de Setúbal e a Direcção Geral de Veterinária pelo alegado incumprimento de funções das duas entidades na captura de cães vadios na Arrábida. A autarquia de Setúbal quer capturar os cães sem “recurso a armas de fogo”, ao contrario do que vai acontecer em Mirandela, no norte de Portugal. A bastonária da Ordem dos Veterinários considera a situação “insustentável” mas pede uma captura “com ética” e culpa quem abandona os animais.  

Mais de cem animais andam à solta na Arrábida 


Cem cães estão a lançar o medo entre os habitantes da Serra da Arrábida. O número é do Clube da Arrábida que refere que o número de animais à procura de comida aumenta e já ocupa uma área significativa do parque natural, incluindo as praias da Comenda, Figueirinha Albarquel, Creiro e Portinho da Arrábida.
De acordo com as gentes que moram na serra, o problema apareceu há 10 anos com o aparecimento de seis cães. Em 2009 eram 40 e agora, segundo moradores, serão uma centena.     
"Como cidadãos, como Clube da Arrábida, levamos já cerca de dez anos de alertas para a Câmara Municipal e para a Direcção Geral de Veterinária, não tendo, até agora, surtido qualquer efeito as nossas reclamações sobre o aumento exponencial dos cães", disse o presidente do clube da Arrábida, Pedro Vieira.
"Sabemos que a Câmara Municipal tem feito um esforço neste último ano, mas que é manifestamente insuficiente para se capturar os animais", acrescentou Pedro Vieira, manifestando o receio de que a situação se possa descontrolar.
O dirigente alerta que “está em causa a saúde pública”, apontado o dedo a “ algumas associações e pessoas que insistem em sistemática e metodicamente alimentar estes cães”. Adverte para o perigo que estes animais representam para a saúde pública, uma vez que não “estão vacinados e facilmente propagam doenças, algumas das quais bastante perigosas para os seres humanos”.
"Estes cães, que actuam em matilha, têm contribuído de uma forma significativa para o declínio de espécies naturais em toda a Serra da Arrábida tais como coelhos, raposas e ginetes, uma vez que os cães são predadores no topo da cadeia alimentar e que, como tal, não tem controlo natural", acrescentou Pedro Vieira.

Ordem dos Veterinários pede captura com ética
Laurentina Pedroso quer "ética" no tratamento dos animais 

A própria Liga Portuguesa para os Direitos dos Animais já admitiu que “não há alternativa para estes animais”, defendendo a sua “captura urgente”. Ressalvando que os animais mais dóceis devem ser dados para adopção enquanto defende que os mais perigosos devem ser abatidos por “eutanásia”.
Também Laurentina Pedroso, Bastonária da Ordem dos Médicos Veterinários, defende esta solução. “Terá de ser um veterinário a tratar disso, como se fosse um advogado destes animais, que deverão ser sedados, através do uso de armas próprias, para serem capturados. Cada situação deverá ser avaliada para se decidir o seu destino próprio. Estes cães vivem em liberdade e estão a colidir com o ser humano, pelo que terá que ser a autarquia com o seu veterinário a resolver o problema. O ideal é a integração na sociedade, com esterilização e adopção, mas para aqueles que já não há essa possibilidade, por estarem assilvestrados, terão de ser abatidos”.
De acordo com Laurentina Pedroso, esta é “uma situação dramática que temos no país com milhares de animais abandonados anualmente, que vão procurar refúgio para sobreviverem. Estes cães fugiram para a serra porque foram abandonados na cidade. Depois facilmente se reproduziram, proliferando”. 

Haverá perigo para a saúde pública?

“Estamos aqui entre o viver num local com muitos animais, que não têm comida, logo ficam esfomeados e mal nutridos, correndo o risco de desenvolver doenças transmissíveis ao homem”. Sendo a Arrábida utilizadas por pessoas a situação é “insustentável”, diz Laurentina Pedroso. No entanto, de acordo com a Bastonária dos Médicos Veterinários, “Os animais têm que ser tratados com respeito e ética. Se devem viver em liberdade e vivem em captura, essa situação tem de ser avaliada para se dar um destino apropriado e não pode ser o cidadão comum a decidir”.

Autarquia promete captura
Autarquia quer capturar sem "matar" os animais 

As preocupações do Clube da Arrábida são partilhadas pelo vereador do Ambiente da Câmara de Setúbal, Manuel Pisco, que reconhece a falta de eficácia da autarquia na captura dos animais, mas adianta que só a Direcção Geral de Veterinária pode autorizar outras medidas mais eficazes.
"Este assunto tem sido tratado com a Direcção do PNA (Parque Natural da Arrábida), do SEPNA (Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente da GNR) e Direcção Geral de Veterinária, sendo esta última a única entidade que tem competência para determinar outras acções para além da recolha, designadamente o abate dos animais, mas que nunca deu abertura para esse tipo de procedimento", disse.
"A Câmara de Setúbal reforçou a recolha de animais durante o último verão, mas os resultados são limitados porque há pessoas que continuam a levar alimentação para os cães vadios, para além de destruírem as jaulas que colocamos na serra para os capturar", acrescentou o vereador do ambiente da Câmara de Setúbal.
Ainda assim, de acordo com fontes da autarquia, a Câmara não quer abater os animais com armas de fogo, como já foi sugerido noutros locais. É o caso de Mirandela, no norte do país, onde a Direcção Geral de Veterinária e a Câmara de Mirandela. Por serem difíceis de capturar, alguns animais poderão ter de ser abatidos a tiro, admitiu o vereador daquela autarquia. "Se já na cidade e nas localidades a captura é complicada, imagine-se animais selvagens no monte", afirmou. Aqui será, pelas contas da Câmara, mais de 200 animais que tem-se juntado no aterro daquela região e têm atacado agricultores e os homens do lixo.



Paulo Jorge Oliveira 

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