Sines recupera 'língua esquecida' da cidade

Autarquia cria glossário digital para manter vivo "linguajar" típico

A Câmara de Sines, no distrito de Setúbal, está a fazer um levantamento de expressões antigas locais, que vão passar a figurar num glossário digital para manter vivo “um linguajar” típico da zona, anunciou a autarquia. O projeto "Dizeres", promovido pelo Arquivo e Biblioteca Municipal de Sines, pretende “valorizar as culturas e as tradições locais”. O ‘Dizeres’ é promovido pela Câmara de Sines e pretende “recolher e estudar informações sobre este falar, para mais tarde divulgar e promover vocábulos e expressões específicas”. Este falar “reflete as vivências destas pessoas e a sua ligação a atividades como a pesca, agricultura, a estiva e a indústria da cortiça, entre outras”, explica a autarquia em comunicado.
Projeto quer recuperar antigos dizeres de Sines 

“Temos um objetivo focado no trabalho de preservação das memórias das nossas gentes e do nosso concelho e esta forma de falar que existe em Sines, além de fazer parte do nosso projeto, é algo que não se pode perder”, disse à agência Lusa o vice-presidente do município, Fernando Ramos.
'Mariola' (alguém reguila), 'gandaia' e 'chui' (sinal que andavam no leilão do peixe, durante a lota) e 'lembrisca' (pessoa curiosa que se mete na vida dos outros) são algumas das expressões já identificadas e levadas para o concelho, do litoral alentejano, pelas comunidades algarvia, setubalense e cabo-verdiana ou pelos descendentes dos ílhavos.
“Há toda esta troca que vai criando uma mistura de palavras de origens diferentes que nos diz muito acerca das origens e influências que esta população tem”, realçou António Campos, técnico da Unidade de Gestão Documental do Arquivo Municipal de Sines, responsável pela recolha.
A equipa de recolha lançou-se, no ano passado, à descoberta de palavras que são usadas pelas gerações mais antigas, analisando vocábulos “com o objetivo de fazer a comparação com o português padrão nos dicionários disponíveis” e “verificar aquelas que são especificas do concelho de Sines”, explicou á Lusa Sandra Patrício, também técnica do arquivo municipal.
“Podemos ter o caso em que as mesmas expressões são usadas, mas com significados diferentes, como por exemplo a palavra 'impostor' que na língua portuguesa normal é alguém que finge ser o que não é. Aqui na região a palavra é usada para alguém vaidoso”, exemplificou.
A palavra 'gandaia' que, em Almada, serve para identificar “a recolha de bocados de cortiça que caiam dos barcos”, em Sines, é usada sempre que “alguém vai à ribeira pedir peixe”, acrescentou.
“O trabalho consiste ainda em fazer o levantamento dos dizeres que existem no português padrão, mas que têm significados distintos daqueles que estão veiculados no dicionário e aqueles que de facto não constam”, referiu.
Uma das expressões que entra nessa categoria é ‘fonico’, termo usado em Sines para “caracterizar uma pessoa sovina que não gosta de emprestar ou dar”, e, este, “é um dos dizeres que não se encontra em nenhum dicionário”, sublinhou a mesma técnica.
A iniciativa conta com o apoio da Universidade de Évora, que ficará responsável pela “validação científica” da recolha, colaborando nas áreas de biologia, linguística e história, através da recolha e publicação dos dados, e a colaboração do ilustrador científico Nuno Farinha.
A recolha ficará concluída em Dezembro deste ano com um glossário, que será disponibilizado na internet para consulta, uma exposição, uma oficina intergeracional e uma brochura para oferecer às escolas.
O projeto "Dizeres", que recebeu um apoio financeiro de 17 mil euros, resulta de uma candidatura do município de Sines ao programa "Tradições 2018-2019" promovido pela EDP.

Agência de Notícias com Lusa 

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