A campanha da irresponsabilidade
A campanha de marketing de guerrilha "À procura de Diana" foi uma lição para todos: para os anunciantes, para os publicitários e marketeers, para os jornalistas e para todos os consumidores de publicidade: mostrou a mais execrável falta de ética e de profissionalismo e justificou que, no mundo actual, a aldrabice convide a mais e mais cinismo por parte dos consumidores de media.
Já tanto se escreveu sobre a campanha de promoção do perfume Catch Me, de Cacharel. Numa espantosa crónica de Marta Tomé, numa rubrica do ADN, já tudo foi dito sobre um tal Ricardo dizia andar à procura de uma rapariga francesa, uma Diana, por quem se apaixonara à primeira vista na manifestação de 15 de Setembro. Desesperado por não a encontrar, o rapaz põe cartazes nas ruas e pede ajuda para localizá-la.
A campanha parecia verídica e mexia com o belo sentimento do amor puro. Milhares de pessoas ficaram enlevadas. Tanto, que a TVI fez uma reportagem com o rapaz. Afinal, era uma espécie de actor, que, decerto com a cobertura dos publicitários, se prestou a mentir - numa notícia de uma estação de televisão – e centenas de milhares ou milhões de portugueses, prosseguiam a farsa iniciada nas redes sociais.Descoberta a fraude, a TVI fez segunda peça: pediu desculpa aos espectadores, acusando. É raro uma TV pedir desculpa. A TVI fê-lo, e bem, de tal forma era abjecta a iniciativa da Cacharel. Nas redes sociais, gerou-se uma revolta tão grande quanto o enlevo inicial de milhares pessoas pela história tomada por verdadeira. A Cacharel ainda sujou mais a nódoa ao emitir um comunicado em que, afinal, acusava as pessoas de terem acreditado. E, ao contrário da TVI, não pediu desculpa!
Este caso deve ser investigado pelas autoridades competentes de forma exemplar, para que não se repita. No Brasil, uma campanha idêntica da Nokia foi imediatamente alvo de um processo (e será que, ainda por cima, os publicitários da Cacharel plagiaram os colegas brasileiros?).
O caso é paradigmático dos perigos éticos do marketing em geral, e de guerrilha em particular: ele inscreve-se no real como se de uma realidade se tratasse, finge que é realidade uma cena montada para promover a venda de produtos ou serviços. Pessoas ingénuas são apanhadas pela mentira no espaço público e utilizadas para promover a actividade comercial.
Onde estão os princípios éticos e morais desta gente? Não pode ser apenas incompetência. Não pode ser apenas inconsciência. É mais: é a incorporação do mal como objectivo para alcançar o fim, para promoção comercial e de vendas. Isto é o contrário da prática da publicidade, que é uma actividade séria, codificada, consensual na sociedade quanto ao jogo de sedução e à justa medida no uso dos elementos reais do produto anunciado e dos elementos ficcionais das suas narrativas.
Felizmente, o caso correu mal. A sociedade reagiu, por impulso moral e ético. O erro ético poderá ter consequência contrária à pretendida: a rejeição pelo público do produto promovido. Era bem feito. Esta não é, definitivamente, a Cinderela do Século XXI que queremos.
Entretanto, o ADN noticiou recentemente a aventura de um dentista canadiano que atravessou o oceano Atlântico para tentar encontrar uma mulher por quem se apaixonou à primeira vista, quando estava de férias na Irlanda. Até ao momento, a história parece ser verdadeira e poderá servir de consolo aos milhares de portugueses que queriam acreditar num amor verdadeiro. Espero que a procura da ruiva mistério não nos desiluda.
Joana Teófilo Oliveira
Estudante de Ciências da Educação
Quinta do Anjo
Quinta do Anjo
O homem que não aceita crítica não é verdadeiramente grande. É tão incomum isso na nossa imprensa que as pessoas acham que é ofensa. Crítica não é raiva. É crítica. Às vezes é estúpida. Outras irónicas. Tantas vezes desiludida e incompreendida. O leitor que julgue. Acho que quem ofende os outros é o jornalismo em cima do muro, que não quer contestar coisa alguma. O tom das Críticas Soltas às vezes é sarcástico. Pode ser desagradável. Mas é, insisto, uma forma de respeito, ou, até, se quiserem, a irritação perante a vida, a política, a sociedade… o mundo, enfim. À quinta-feira por Joana Teófilo Oliveira para o ADN.
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