O país das PPP

Impressões Digitais by Paulo Jorge Oliveira

O país das PPP

Autoestradas são o maior encargo das PPP até 2039 


Estamos muito pior do que supúnhamos. Do que nos diziam. Hoje. Ontem. Há um ano. Amanhã? Amanhã... Que gente sem passado nos tirou o futuro? Que miséria é esta, de que só se sai entrando nela? Que justiça social é possível, se há tantos condenados mas faltam culpados? Sede bem-vindos ao novo Orçamento de Estado (OE). 2012 será talvez o ano mais longo das nossas vidas. 
Este OE não é bom nem é mau. Não é sequer o Orçamento possível. É um orçamento desesperado contra a tragédia. É uma bala única para acertar num alvo. Este é um OE de alto risco. Para a economia. Para os portugueses. Para o Estado. Para si próprio. 
Os cortes brutais na função pública e as reduções abruptas nos salários líquidos da iniciativa privada são uma queda dramática do rendimento disponível dos portugueses. De um dia para o outro. Como um avião que cai num poço de ar, os trabalhadores por conta de quem quer se seja, incluindo de si mesmos, perdem rendimento. 
Mas tem de ser assim, dizem. É verdade, tem mesmo devido aos erros teimosos do passado e à tentativa de sermos um país “com luxos” quando, na verdade, não tínhamos capacidade para tal.   
Um exemplo indesmentível: as parcerias público-privadas, as míticas PPP. Se procuram crimes sem guerra, eles estão aí. Basta abrir este Orçamento e ler o que para lá vai sobre PPP. O que era negócio seguro é uma sangria para décadas. Sobretudo nas estradas: a conta para o Estado sobe mais 4,8 mil milhões. O prazo para o equilíbrio financeiro é adiado mais dez anos. Para 2039. 
Todas estas infra-estruturas estão a rebentar nas contas do Estado. As PPP das estradas estão falidas e o prejuízo será público. Por cada obra que se pára - na ferrovia, nas estradas, nos aeroportos, nos hospitais - há uma factura para o Estado pagar. Não foi por falta de aviso. De milhares de avisos. Não há responsáveis? 
"Portugal é o campeão europeu das parcerias público-privadas", afirmou há um ano um juiz do Tribunal de Contas, frisando que o seu valor ascende a 1500 mil milhões de euros, enquanto em França não chega a 500 mil milhões de euros. Em Espanha e Itália as parcerias são de 289 mil milhões e de 66 mil milhões de euros, respectivamente”. Isto coloca, de acordo com Carlos Moreno,  o país com “ problemas graves de sustentabilidade das Finanças Públicas". O juiz defendeu também que o Estado deveria renegociar algumas parcerias público-privadas que "são verdadeiramente vergonhosas”.
Alguém do Governo de então – na altura ainda o PS de Sócrates – o ouviu? Não. E Passos Coelho parece seguir pelo mesmo caminho.
Inaugurado há 4 anos, o MST nunca foi rentável 

Olhe-se, por exemplo, o caso do Metro Sul do Tejo, em Almada e Seixal. A obra é importante, não se discute isso, mas o Estado não pode gastar 7,5 milhões de euros por ano só porque a empresa não consegue passageiros ou, melhor, quanto 25 por cento das pessoas andam sem pagar e... a empresa não faz nada. A ética dos privados ganham se existir lucro e se houver prejuízo pagamos todos não – nem deve – continuar.  A Metro Sul do Tejo é vista pelo Tribunal de Contas como uma “empresa inviável”.
Ainda assim, quer o Estado quer a empresa não têm se esforçado para melhorar o quer que seja. Correm os dias e vamos todos pagando...
Alves dos Reis foi o maior dos nossos alquimistas. Transformou uma ilusão em dinheiro sonante. A ficção em realidade. Há quem acredite que se existisse um Alves dos Reis hoje, o País viveria isento da crise. Nadando em notas, envolto em consumo. Quando se descobrisse o conto do vigário, o crime já teria prescrito, à boa maneira indígena. Alves dos Reis é o herói do imaginário português. É o guru de uma forma de gestão. Olhe-se para 2039. Um número pequeno que envolve milhões de euros. Ou milhares de milhões. Só nessa altura, um futuro muito distante, as PPP fornecerão receitas ao Estado. Até lá, os contribuintes cumprirão o dever cívico de as subsidiar. As PPP tentaram ser o negócio de Alves dos Reis dos tempos modernos. Mas não tiveram a sua elegância. Aproximou-se: a espoliação do Estado e dos contribuintes foi feita em nome do bem público. Nada como os deserdados agradecerem por o serem. É assim que se faz política e negócios em Portugal, país das meias-tintas.
O país de Alves dos Reis é o país dos "pequenos favores", que acabam em PPP e em "BPNs" ou pequenas e grandes Madeiras. Há um saldo negativo neste mundo de brincar à gestão. 2039 nunca mais chegará. Mas quem ganhou com as PPP continuará a usufruir da renda perpétua. Enquanto o corte das gorduras do Estado não chegar aqui, todos esperaremos que Alves dos Reis volte para nos salvar. 

Paulo Jorge Oliveira
agencianoticias.adn@gmail.com 

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