Morreu o músico que buscava o silêncio
O corpo do pianista foi resgatado ontem à tarde, numa zona rochosa junto à
Praia do Abano, no Guincho, por elementos dos Bombeiros Voluntários de
Alcabideche, Polícia Marítima, Instituto de Socorros a Náufragos e INEM,
durante uma operação delicada, que obrigou a descer homens recorrendo a cabos. O
ADN soube que, no local, não existiam elementos suficientes para identificar o
corpo, tendo este sido conduzido para a morgue do Cemitério da Guia, em
Cascais, onde deverá ser autopsiado até amanhã. Hoje, ao princípio da tarde, a
família identificou o corpo. Durante a operação de resgate, as autoridades no local colocaram as
hipóteses de acidente ou suicídio.
Bernardo era considerado um dos melhores músicos nacionais |
Bernardo Sassetti, que morreu aos 41 anos, era
considerado um dos mais criativos pianistas da sua geração, para lá das
fronteiras do jazz e que vivia inquieto em torno da música e da imagem.
Numa entrevista a Maria João Seixas, Bernardo Sassetti
descrevia-se como “um terrestre que caminha de uma forma muito aérea, muito
suspensa, à procura de qualquer coisa, sobretudo na música, que ainda não sabe
muito bem o que é”.
“E isso inquieta-me o espírito. Sempre. Vivo com esta
inquietação vinte e quatro horas por dia”, afirmou na altura o músico.
Bernardo Sassetti nasceu em Lisboa a 24 de Junho de
1970. Bisneto de Sidónio Pais, era casado com a actriz Beatriz Batarda, com
quem tinha duas filhas.
Começou a estudar piano aos nove anos, teve formação
clássica, mas foi no jazz que fez caminho, influenciado por Bill Evans.
O percurso, feito desde os 18 anos, quando começou a
tocar com Carlos Martins e com o Moreiras Quartet, foi transversal na música
portuguesa, tendo trabalhado com músicos do jazz, do fado, do pop rock, do hip
hop.
Viveu em Londres e em Espanha e gravou o primeiro
álbum, Sassetti, com 23 anos, rodeado de músicos amigos e influenciado pelos
sons latinos.
É com o terceiro álbum, Nocturno, de 2002, gravado com
Carlos Barretto e Alexandre Frazão, que atrai as atenções da crítica, já depois
de ter tocado com vários músicos estrangeiros, entre os quais o trompetista Guy
Barker, com quem gravou num disco ao lado da Orquestra Filarmónica de Londres.
Entre os últimos registos do pianista contam-se Carlos
do Carmo - Bernardo Sassetti, uma participação no disco Mútuo Consentimento, de
Sérgio Godinho, e 3 Pianos, com Mário Laginha e Pedro Burmester.
A transversalidade do seu talento levou-o a colaborar
com os Da Weasel, com Camané, Luís Represas, Perico Sambeat, gravou com Mário
Laginha o álbum Grândolas, escreveu para teatro, para A casa de Bernarda Alba,
com encenação de Diogo Infante, gravou com orquestras, a solo e em trio.
Cinema, outra paixão
O Piano foi, desde sempre, a sua maior paixão |
Tinha uma particular paixão pela imagem e pelo cinema.
Trabalhou com realizadores portugueses e estrangeiros, compôs, por exemplo,
para o filme O talentoso mr. Ripley, de Anthony Minguella, Alice, de Marco
Martins, A costa dos murmúrios, de Margarida Cardoso, Um amor de perdição, de
Mário Barroso, 98 Octanas, de Fernando Lopes.
A união dessas duas paixões, a música e a imagem (através
do cinema e da fotografia), deu-se no projeto Unreal: Sidewalk Cartoon, em
2006, ou em Motion, de 2011
Ao vivo tinha ainda um projecto de música e literatura
com Beatriz Batarda.
Na mesma entrevista a Maria João Seixas, disponibilizada
no site oficial do músico, Bernardo Sassetti disse: “Quando se vive muito
intensamente a música, a música que vive cá dentro, que vem cá de dentro a
fervilhar, o grande segredo para a sua transmissão e partilha é o acto contido
sobre o que temos e encontramos no fundo de nós”.
Agência de Notícias
Comentários
Enviar um comentário