Governo quer alterar prestações sociais


“Em nome da justiça social”, diz o ministro


Ministro da Solidariedade e da Segurança Social promete "rigor" e "combate à fraude" na atribuição das prestações sociais, pelo que o rendimento social de inserção (RSI) passa a ser "transitório" e a exigir deveres de quem o recebe. Pedro Mota Soares quer também mexer no subsídio de doença, maternidade e limitar o subsídio de morte a 2500 euros. UGT e CGTP não gostaram de saber das medidas do governo “pelos jornais”. O assunto está a ser debatido em sede de concertação social.

Ministro quer pessoas do RSI ativas e a procurar emprego

Pedro Mota Soares, ministro da Solidariedade e da Segurança Social, justificou ontem à noite as alterações propostas pelo Governo na atribuição de várias prestações sociais, explicando que visam corrigir injustiças, reforçar o rigor e combater a fraude.
“É muito importante que quem está com subsídio de doença não receba mais do que se efectivamente estivesse a trabalhar”, afirmou o ministro aos jornalistas no final da reunião de concertação social, onde estas medidas foram hoje apresentadas.
Explicou que no caso do subsídio de doença, a alteração visa “repor o sistema que já esteve em vigor em 2004” e representa um “desincentivo” a que se “possam atribuir prestações sociais” superiores ao valor que a pessoa receberia se estivesse a trabalhar.
O Governo pretende reduzir o valor do subsídio de doença às baixas de curta e média duração, penalizando quem ficar arredado do mercado de trabalho até um período de 90 dias. No subsídio de doença, desde 2005 que os primeiros 90 dias de baixa dão direito a uma prestação equivalente a 65% da remuneração de referência. Agora, o Governo pretende baixar essa percentagem, criando diferentes escalões: baixas de um mês darão direito a 55% do salário enquanto as que durarem entre um mês e 90 dias darão direito a 60%.
Mota Soares frisou por diversas vezes a importância de “atribuir prestações com rigor e de forma justa”, realçando que o Governo tem “muita preocupação” em salvaguardar as pessoas com rendimento mais baixos, lembrando que este ano as pensões mais baixas foram aumentadas a um milhão de portugueses.

Benificiários do RSI vão ter de fazer trabalho comunitário e procurar emprego
O Governo pretende rever o regime do rendimento social de inserção (RSI), reforçando o seu caráter transitório e a natureza contratual da prestação, nomeadamente reforçando a obrigatoriedade de procura ativa de emprego.
O RSI serve “para inserir as pessoas” e não para “manter as pessoas durante muito tempo a receber a prestação”, afirmou o ministro, reforçando que “numa altura em que estão a ser exigidos sacrifícios aos portugueses, para sair da crise em que nos encontramos, a atribuição de prestações sociais tem que ser feita com mais rigor” e é importante “combater a fraude nas prestações sociais”
No caso do RSI, esta prestação “dá um conjunto de direitos às pessoas, mas também deveres”, afirmou o ministro, destacando que os beneficiários têm que estar efectivamente à procura de trabalho e serem úteis à sociedade. Destacou que quem tem carros de valor elevado, ou contas bancárias muito elevadas, não deve poder receber RSI.
"No que respeita ao rendimento social de inserção, o Governo procede a uma revisão global do seu regime jurídico, em consonância com os objetivos constantes do seu Programa, reforçando o carácter transitório e a natureza contratual da prestação, constitutiva de direitos e obrigações para os seus beneficiários, enquanto instrumento de inserção e de coesão social", lê-se na proposta do Governo apresentada hoje aos parceiros sociais.
O documento, que foi uma surpresa para os parceiros sociais, dá "um novo enfoque aos deveres de procura ativa de emprego, de frequência de ações de qualificação profissional e de prestação de trabalho socialmente útil como formas de inserção sócio-profissional dos titulares da prestação e dos membros do seu agregado familiar".
Assim, "institui-se de forma clara a obrigação dos beneficiários da prestação de rendimento social de inserção estarem obrigados a inscrever-se para emprego, no centro de emprego, com vista à procura ativa de emprego, e a desenvolverem trabalho socialmente útil, nos termos em que vier a ser regulamentado em diploma próprio, como forma de participação na sociedade".
A proposta prevê ainda a alteração do valor da condição de recursos "passando o acesso à prestação do rendimento social de inserção a estar dependente de o valor do património mobiliário e o valor dos bens móveis sujeitos a registo, do requerente e do seu agregado familiar, não serem, cada um deles, superior a 60 vezes o valor do indexante dos apoios sociais (IAS)", ou seja, cerca de 25 mil euros.
No que concerne especificamente à prestação de rendimento social de inserção, o Governo pretende também desindexar o RSI do valor da pensão social, passando a indexá-lo ao IAS.
"O rendimento social de inserção passa a ter como condição de atribuição a celebração do contrato de inserção, não bastando, como acontece presentemente, o compromisso do titular da prestação em vir a subscrever e a prosseguir o referido programa, evitando-se assim situações de recebimento da prestação dissociadas do cumprimento de um programa de inserção social e profissional por parte dos beneficiários da prestação", de acordo com a proposta.
A renovação anual da prestação deixa de ser automática passando a estar dependente da apresentação de um pedido de renovação por parte dos respetivos titulares.


Menos dinheiro para baixas
Baixas médicas sofrem cortes 

O Governo pretende também harmonizar a forma de cálculo dos subsídios de maternidade, paternidade e adoção com o subsídio de doença, deixando de se ser considerados para tal os subsídios de férias e de Natal.
No caso do subsídio de doença, este também irá sofrer alterações. A proposta do Executivo prevê a redução do subsídio de doença para os 55 por cento para situações de incapacidade temporária inferiores ou iguais a 30 dias.
Os beneficiários com incapacidade temporária de duração superior a 30 dias e inferior ou igual a 90 dias passam a receber um subsídio equivalente a 60 por cento do respetivo salário. Já os beneficiários que estejam doentes mais de 90 dias e menos de 365 dias terão direito a um subsídio equivalente a 70 por cento do seu ordenado. Para incapacidades temporárias superiores a 365 dias, o subsídio de doença será de 75 por cento do valor do salário.
Estas propostas serão discutidas ainda este mês em reuniões bilaterais entre Mota Soares e os parceiros sociais.

Harmonizar subsídio de maternidade 
O Governo pretende ainda “harmonizar” a forma de cálculo dos subsídios de maternidade, paternidade e adoção com o subsídio de doença deixando de se ser considerados para tal os subsídios de férias e de Natal.
“No âmbito da proteção na maternidade, paternidade e adoção, os subsídios de férias, de Natal e outros de natureza análoga deixam de ser considerados para efeitos de apuramento da remuneração de referência que serve de base de cálculo aos vários subsídios previstos na lei".
Além da harmonização entre os dois regimes de proteção social acima referidos, esta alteração permite eliminar situações de falta de equidade entre beneficiários pelo facto de a remuneração de referência nuns casos "integrar aqueles dois subsídios, noutros só ter em conta um deles, e, nalgumas situações não relevar nenhum desses subsídios"
O documento destaca ainda que, tendo em conta esta harmonização, vai instituir "no regime de proteção na maternidade, paternidade e adoção, uma prestação compensatória do não pagamento pela entidade empregadora dos subsídios de férias, de Natal ou equiparados, em moldes semelhantes ao que acontece no regime de proteção na doença".


Governo limita subsídio de morte a 2500 euros
O governo propôs também um limite máximo para o valor do subsídio por morte de cerca de 2500 euros, conforme previsto no Orçamento do Estado para 2012.
No sistema previdencial, na eventualidade de morte, a proposta prevê também o limite "do valor da pensão de sobrevivência do ex-cônjuge, do cônjuge separado judicialmente de pessoas e bens e da pessoa cujo casamento tenha sido declarado nulo ou anulado, ao valor da pensão de alimentos recebida, com o limite máximo igual ao valor da pensão de sobrevivência a que o cônjuge sobrevivo tem direito".
A proposta elimina também o prazo de caducidade de cinco anos para acesso à pensão de sobrevivência, "podendo esta, ser requerida a todo o tempo, com efeitos para o futuro no caso de ser requerida após seis meses o óbito do beneficiário" e adequa "os prazos para requerimento do subsídio por morte e do reembolso das despesas de funeral".
O documento procede "no âmbito do sistema previdencial à alteração dos regimes jurídicos de proteção nas eventualidades de doença, maternidade, paternidade e adoção e morte, no âmbito do subsistema de solidariedade à revisão do regime jurídico do rendimento social de inserção e da lei da condição de recursos, e no âmbito do subsistema de proteção familiar à alterações do regime jurídico da proteção na eventualidade de encargos familiares, introduzindo mecanismos que reforçam a equidade e a justiça na atribuição destas prestações", conclui a proposta do ministro.

UGT e CGTP contra divulgação das medidas
Líder da UGT criticou 'timing' da divulgação das propostas 

Perante a apresentação das medidas, o secretário-geral da UGT, João Proença, criticou o Governo à saída da reunião da concertação social, considerando inadequada a divulgação da proposta das novas regras das prestações sociais no próprio dia do encontro entre os representantes dos parceiros sociais e do Governo.
Em declarações transmitidas pela SIC Notícias, o líder da UGT considerou o momento da divulgação prévia à imprensa “inadequado”, por ter sido feito no próprio dia da reunião, mas elogiou o facto de estar já definido um calendário com discussões temáticas na concertação social.
A crítica em relação ao novo pacote de regras foi repetida por Joaquim Dionísio, da CGTP, que no final da reunião confirmou que as medidas “ficaram para ser analisadas posteriormente”, porque os parceiros sociais só tiveram hoje acesso ao documento.
Questionado pelos jornalistas sobre as críticas feitas pelos representantes das duas centrais, o ministro da Economia desvalorizou a questão, insistindo que “o Governo valoriza o diálogo social”. Acrescentou ter transmitido aos parceiros “o que está a ser feito no terreno” para aplicar as reformas previstas no acordo da concertação assinado em janeiro com as confederações patronais e a UGT.
João Proença, por seu lado, referiu-se ao acordo como “um quadro de cedências mútuas” e garantiu que a UGT vai estar vigilante em relação à implementação das medidas vertidas no documento. “Se houver violações sistemáticas”, afirmou, “será matéria para denunciar o acordo”. Mas frisou estar convicto de que o Governo vai cumprir o que ficou acordado.
Questionado sobre se estava arrependido de ter assinado o acordo para a competitividade e o emprego, Proença respondeu: “Não (…) Para o país, [o pacto] foi importante”.


Paulo Jorge Oliveira 

Comentários