Javalis descem às praias da Arrábida em busca de comida

População "excessiva" de javalis preocupa populações de Azeitão e das praias da Arrábida 

Os javalis preferem bosques com bastante vegetação onde possam esconder-se. Os javalis passam grande parte do dia fuçando a terra em busca de comida. São animais que adoram banhos mas de lama, não são animais da praia. Não? Bom, não é o que dizem os frequentadores das praias da zona da Arrábida. Subitamente, no início do verão passado, pequenos grupos destes porcos selvagens passaram a ser vistos à beira-mar - e até a escavar mexilhão na rocha! -, de manhãzinha ou ao final da tarde. Pode ser a nova atracão da região [a juntar aos golfinhos do Sado] mas muitos querem "acabar" com a vida dos porcos selvagens nas praias e na serra da Arrábida, como a presidente da junta de freguesia de Azeitão que defende medidas extremas para lidar com "uma possível praga" de javalis na serra.  No entanto, o javali sempre fez parte do ecossistema da Arrábida. Tem alimento e está bem adaptado à zona. Mas por toda a serra o número de exemplares tem aumentado que o próprio Instituto da Conservação da Natureza e Florestas reconhece que é "excessiva". O controle têm sido feito através de caçadas "controladas" que já abateram cerca de 120 animais. 

Vara de javalis ocupam praias da Arrábida em busca de comida 
 "Foi na altura do Mundial de Futebol: as pessoas estavam aqui na esplanada quando eles começaram a aproximar-se e a ganhar confiança", recorda Orlando Soares, gerente de O Farol, um dos restaurantes da praia do Portinho, antes de acrescentar que, há dias, ainda não eram três da tarde e já os bichos andavam por ali. As pessoas não resistem a fotografá-los", escreve a revista Visão. Apesar do risco - porque são animais selvagens - ninguém resiste a uma "fotografia" aos animais ou até uma "selfie" com eles.
Além dos passeios à praia, onde acabam por revirar os caixotes do lixo à procura de comida, passaram a suceder-se igualmente investidas desses javalis no lado urbano da Arrábida, em Azeitão. "Vêm esfomeados e já chegaram até ao Parque da Cidade" (uma zona verde, com café e parque infantil), onde revolveram o relvado, junto aos sobreiros, para se banquetearem com as bolotas. "Isto é uma praga", considera Celestina Neves, presidente da Junta de Freguesia de Azeitão. 
A autarca avisa que  é "preciso fazer alguma coisa antes que haja um acidente". E já houve um encontro imediato entre um javali e um carro, no troço a caminho de Setúbal, saldando-se no desfecho pouco simpático de ter um animal ferido, chapa amolgada e uma condutora em estado de choque.
Mas também há ainda quem não se conforme com os danos à flora da serra, sobretudo as orquídeas, raríssimas, cujos bolbos são uma refeição gourmet para os javalis. "Um senhor que tinha ido ver as flores até chorava: não havia nada...", continua a autarca, recordando que os bichos não têm predador e que, por estarem na zona protegida do Parque Natural, "só quem tem terreno agrícola e licença de porte de arma é que os pode caçar".
"Neste momento, são mais do que uma ameaça: não só devastaram a flora, como alteraram a estrutura do solo, ao lhe introduzirem azoto por via dos seus excrementos", explica Jorge Capelo, investigador em ecologia da vegetação. E deixa o alerta: "Em seu lugar, está a crescer uma flora oportunista. A original vai demorar muito a recuperar. Se recuperar...", diz o investidor. 

 Instituto da Conservação da Natureza e Florestas  reconhece problema
Em declínio até aos anos 1970, os javalis são hoje uma população crescente em toda a Europa. Há um ano, um relatório apresentado no Parlamento Europeu falava mesmo de uma "explosão populacional", uma expansão que já tinha levado as autoridades alemãs e francesas a convocarem os caçadores para ações de controlo em Berlim e Toulouse. Ninguém sabe explicar ao certo como apareceram os primeiros javalis na Arrábida, há cerca de cinco anos, onde já não davam sinais de vida há décadas. Afirma-se que alguém terá trazido alguns exemplares para ali que logo se reproduziram. As fêmeas podem ter duas ninhadas de quatro a cinco crias a cada três anos, o que explica o boom.
"Aqui também vai ser inevitável", concorda Pedro Vieira, do Clube da Arrábida, associação de moradores criada para preservar a zona. Para já, conseguiu o aval do Parque Natural e do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas para organizar três caçadas. Na primeira, em Janeiro, não mataram nenhum bicho; nas outras duas, apenas oito exemplares. "Mas aqui há centenas, vai ser preciso encontrar um outro método", diz, João Carvalho, da Associação de Proprietários Rurais, adiantando que provavelmente vão optar por capturar os animais vivos, com armadilhas - e sem tiros.
No entanto, o javali sempre fez parte do ecossistema da Arrábida. Tem alimento e está bem adaptado à zona. Mas por toda a serra o número de exemplares tem aumentado que o próprio Instituto da Conservação da Natureza e Florestas reconhece que é "excessiva". De acordo com a diretora desse instituto, "Hoje temos um problema de excesso de população. Não tendo predadores naturais e estando muito adaptado, a população foi crescendo".  Assim, explica  Instituto que tutela o Parque Natural, a única forma de controlar o número de animais é através daquilo que chama " acções de correcções de densidade". Ou seja: caça. "Em 2014 firam passadas cerca de 100 credenciais e foram abatidos cerca de 110 javalis. Este ano já foram feitas três acções controladas pelo instituto e apenas conseguimos abater nove javalis", diz Maria... 

Presidente da junta de Azeitão quer "acabar" com javalis na Arrábida 
Presidente da junta de Azeitão quer  acabar com javalis na serra 
Ora, a presidente da Junta de Azeitão quer mais, muito mais. Celestina Neves quer uma caça mais "sistemática e de forma a acabar com este animais dentro da serra da Arrábida", disse em entrevista à SIC. A autarca defende esta medida "estrema" para por travão nos danos nos espaços públicos e no perigo que diz representar para as pessoas. "Os animais atravessam sem problemas a estrada nacional 10 o que pode resultar numa catástrofe, vão junto das casas das pessoas o que significa que hoje as pessoas podem sair de casa e defrontarem-se com um javali", conclui a autarca. 
Uma visão diferente têm os autores do documentário da "Arrábida da Serra ao Mar", Luís Quinta e Ricardo Guerreiro, que defendem  que os "javalis podem ser uns 'embaixadores' para que as pessoas venham à Arrábida para ver estes animais", diz Luís Quinta, que também é fotografo de natureza. No entanto, confessa que "tudo isso tem de ser equilibrado e controlado". 
Indiferentes à polémica há sempre quem se aproxime e alimente os animais. "Eles estão completamente à vontade. Nós nem por isso...", diz  Maria João, que explora o Zeca, outros dos estabelecimentos da praia, e em cuja porta se vê o aviso, assinado com os símbolos do Instituto da Conservação da Natureza e Florestas e do Parque Natural da Arrábida: "Têm sido avistados javalis nesta área. A bem da sua segurança, não os alimente nem coloque comida à vista. Não se aproxime. Lembre-se que estes animais são selvagens". 
Carlos Mitrena e Luísa Rodrigues, que moram, na serra, lembram que os javalis "já ali existiam há séculos. Foi o homem que entrou no espaço deles e dizimou os predadores naturais. Está na altura de voltar a devolver a serra aos 'bichos' e introduzir de forma controlada alguns predadores. É assim que as coisas se resolvem na natureza". 



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