Quem não pedir factura arrisca multa

Em nome do combate à economia paralela... mas nem todos concordam 

Não é só quem vende que está obrigado a passar fatura. Quem compra também a terá de requisitar, sob pena de ser multado pelos inspectores das Finanças, que têm vindo a apertar o cerco nesta matéria, desde que a nova legislação entrou em vigor. Isto porque a alteração ao Código do IVA decreta que as regras de facturação abranjam tanto as empresas, como os consumidores finais. Tudo isto, em nome do combate à economia paralela. Assim, os consumidores que não exigirem factura podem incorrer numa coima entre os 75 e os 2.000 euros. Mas há quem não “acredite” que possa ser possível e um ex–secretário de estado deste governo prometeu mandar o fisco “tomar no cu” caso um dia venha a ser abordado sobre a obrigatoriedade de pedir fatura. 

Se não pedir fatura pode ser multado 

Todos os consumidores estão obrigados a pedir fatura no ato de qualquer compra. Quem não o fizer arrisca uma multa do fisco, que varia entre 75 euros e 2.000 euros. 
Isto porque houve uma alteração ao código do IVA, que entrou em vigor em Janeiro, e que já foi confirmada pelo secretário de Estado, Paulo Núncio. Pelo que, os consumidores estão obrigados a garantir que os comerciantes/prestadores de serviços lhes passam fatura, avançou esta quarta-feira o Jornal de Negócios.
E se não passarem, cabe aos consumidores exigirem-na. Isto porque se efetuarem uma compra e saírem de mãos vazias, podem mesmo ser multados.
Até aqui, a lei apenas exigia essa obrigação aos empresários em nome individual ou aos profissionais liberais. Mas agora, com o novo decreto-lei (197/2012) tudo mudou. A exigência passa a ser necessária em praticamente todas as situações.
Dar o número do contribuinte não é, para já, obrigatório (apesar de ser útil), mas o nome e a morada podem sê-lo. A ideia é combater a economia paralela, a fraude e evasão fiscal.

Multar “só é possível” no ato da venda
Ainda assim, o bastonário da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, Domingues Azevedo, disse à Lusa que multar os consumidores que não exijam faturas só é possível na realização da venda, porque o comprador não é obrigado a preservar a prova.
“O elemento de prova é um problema, a fiscalização só pode ser feita just in time [no momento], por ser necessária prova inequívoca e comprovada”, afirmou o bastonário da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, acrescentando que não tem conhecimento de qualquer coima aplicada por este motivo.

Sindicato diz que multa “é pólvora seca”
Já o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI) garantiu que a legislação que prevê multas aos consumidores que não exijam faturas “é pólvora seca”, porque os serviços não têm “nem meios, nem estatuto legal” para fiscalizar.
“A obrigatoriedade de quer quem faz a prestação de serviços ou vende o produto, quer quem adquire, pedirem fatura e poderem ser multados [se não o fizerem] já existia antes, mas não temos nem meios, nem temos autoridade para que se faça esse tipo de inspecção”, disse Paulo Ralha.
Segundo o dirigente sindical, mesmo que um funcionário da Autoridade Tributária e Aduaneira presencie uma situação irregular desse tipo, “não pode atuar imediatamente: Temos que ir relatar a situação ao chefe de finanças, que então nos passa uma ordem de serviço para autuarmos. Ora, quando chegarmos ao local, os dois agentes já não estão lá e passa a oportunidade para autuar”, explicou.
“Não temos meios, mas, mesmo que os tivéssemos, não temos um estatuto legal que nos permita atuar imediatamente, ou seja, andamos a brincar com a legislação. Enquanto os trabalhadores da Autoridade Tributária e Aduaneira não tiverem vínculo, nem competências nesse domínio, pode dizer-se que fazemos e acontecemos porque, na prática, não é assim. Não temos nem competências, nem autoridade para efetuar esses autos de notícia”, sustentou Paulo Ralha.

“Um erro histórico” segundo a Deco
A associação de defesa do consumidor Deco considera que seria “um erro histórico” multar algum comprador por não exigir factura, sustentando que é “uma exigência que não faz sentido e dificilmente poderá ser implementada”.
“Fazer impender sobre os consumidores a obrigação de pedir uma factura não nos parece justo, nem correcto, porque é o prestador de serviço que recebe o nosso dinheiro e que com ele paga os seus impostos, portanto é sobre ele que deve impender a obrigação de passar o respectivo recibo”, afirmou o secretário-geral da Deco, em declarações à agência Lusa.
Na opinião de Jorge Morgado, a possibilidade – prevista na lei – de penalizar, com multas, os consumidores que não peçam factura “é uma situação perfeitamente injusta e seria um erro histórico se alguma vez alguém fosse multado por isto”.
“É o género de exigências que não fazem sentido e que dificilmente poderão ser implementadas”, sustentou, numa reacção à notícia do Jornal de Negócios de que “os consumidores que não exigirem factura arriscam multa”.
Para a Deco, “seria muitíssimo mais importante e produtivo utilizar o tempo dos fiscais das Finanças em matérias mais importantes, como os grandes negócios e as grandes fugas a impostos, e não propriamente pô-los a fiscalizar os consumidores ou por os consumidores a serem fiscais de finanças, que não são, nem querem ser”.

Pedir fatura? Ex-governante promete mandar fiscais “tomar no cu”

Francisco José Viegas promete desafiar ordem... se lhe pedirem fatura 

Mas há quem ainda vá mais longe. É o caso do ex-secretário de Estado da Cultura (do PSD) que prometeu mandar o fisco “tomar no cu” caso um dia venha a ser abordado sobre a obrigatoriedade de pedir fatura. O post de Francisco José Viegas é dirigido ao secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, e a sua autoria foi confirmada pelo próprio à TVI24. Viegas não quis adiantar mais comentários.
“Queria apenas avisar que, se por acaso, algum senhor da Autoridade Tributária e Aduaneira tentar fiscalizar-me à saída de uma loja, um café, um restaurante ou um bordel (quando forem legalizados) com o simpático objectivo de ver se eu pedi factura das despesas realizadas, lhe responderei que, com pena minha pela evidente má criação, terei de lhe pedir para ir tomar no cu, ou, em alternativa, que peça a minha detenção por desobediência”, escreveu Viegas no blog A Origem das Espécies.
O ex-governante acrescentou ainda que o “pobre funcionário” do fisco “não tem culpa nenhuma”. “Mas se a Autoridade Tributária e Aduaneira quiser cruzar informações sobre a vida dos cidadãos, primeiro que verifique se a C. N. de Proteção de Dados já deu o aval, depois que pague pela informação a quem quiser dá-la”, acrescentou Francisco José Viegas.


Agência de Notícias 

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