Manifestações contra acordo internacional que pode ser uma forma de censura

“Seremos todos vigiados pelo ACTA”

 “Partilhar não é roubar”, “ACTA, não!” e “ACTA is watching you” [O ACTA está a ver-te] são alguns dos slogans que várias dezenas de pessoas envergavam em cartazes, no sábado de manhã, no Marquês de Pombal, em Lisboa. A manifestação foi global e também passou por Setúbal, onde a juventude do Bloco de Esquerda pintou um mural de 18 m2 junto ao Instituto Politécnico de Setúbal, em defesa da liberdade de expressão, pelo livre acesso à internet e contra o fim dos medicamentos genéricos.

Manifestantes querem partilhas seguras na net 



Em causa está o Acordo Comercial Anticontrafação (ACTA, na sigla em inglês), criado com o objetivo de proteger os direitos de propriedade e intelectual, muitas vezes partilhados via internet, mas visto com receio pelos cibernautas, que dizem que o acordo vai acabar com muitos dos direitos de quem “anda na rede”.
A preocupação de Guilherme Oliveira, que se deslocou ao Marquês de Pombal, é o impacto que a lei vai ter na difusão de medicamentos genéricos. “Na forma actual, os medicamentos são lançados no mercado e, depois de certo período de tempo, cai o título de direitos de autor e as empresas podem começar a fazê-los, o que faz com que o preço baixe bastante”, explica o estudante de Medicina.
Mas, um dos pontos que são defendidos pelo ACTA é que o título de direitos de autor passa a ser vitalício e isto a longo prazo tem um custo enorme. Quem é que vai pagar? O Serviço Nacional de Saúde, que já está decrépito, ou nós?”, interroga ainda Guilherme Oliveira.

Devassa da vida privada

Nuno Oliveira, um outro manifestante que tirou a máscara usada pelo grupo de hackers [piratas informáticos] para falar com a Lusa, considera que se trata de “uma lei do mais atroz que existe” porque “controla todas as trocas” que se façam via internet, “desde os bilhetes de comboio, medicamentos e até comida”.
Esta lei visa criar uma entidade ou dar a entidades já existentes a liberdade e o poder para poderem controlar qualquer tipo de servidores privados que já existam ou qualquer tipo de informação que esteja a ser divulgada», sintetiza o jovem, acrescentando que «todo o fluxo de medicamentos, tudo o que esteja num servidor informático será controlado e possivelmente gerido por essas mesmas entidades”.
O Marquês de Pombal, em Lisboa, foi o ponto de encontro de uma concentração que não tem organizadores (“Somos todos líderes”, explicou uma manifestante) e que reuniu dezenas de pessoas ao fim da manhã de sábado. Numa manifestação pacífica, os participantes formaram um círculo junto àquela rotunda central da capital, onde alguns falavam alternadamente num megafone, demonstrando o seu descontentamento.
Estão a desvirtuar o princípio da internet, que é a partilha da informação. Uma das coisas que criticavam nos tempos de Salazar era a censura e a impossibilidade de falar e, neste momento, foi o que fizeram: o Governo português impôs censura”, disse  um manifestante vestido de preto e com a cara coberta pela máscara de Guy Fawkes, um inglês que, no século XVII, tentou fazer explodir o parlamento britânico, num atentado falhado.

Bloco de Esquerda fez ação de protesto em Setúbal 
 BE de Setúbal escreveu mural em Setúbal 

No dia da manifestação internacional contra o Anti-Counterfeiting Trade Agreement (ACTA), os jovens do Bloco de Esquerda pintaram um mural de 18 m2 junto ao Instituto Politécnico de Setúbal, em defesa da liberdade de expressão, pelo livre acesso à internet e contra o fim dos medicamentos genéricos.
Na ocasião, os jovens do BE “repudiam o acordo multilateral que pretende instalar um verdadeiro "big brother" na Europa, em que as empresas operadoras de comunicações poderão vigiar e investigar todo o histórico dos utilizadores de internet, downloads e partilhas que efetuam ou, mesmo, citações que façam”. 
De acordo com o BE, se “entrar em vigor, um cidadão ou uma cidadã que efetue qualquer atividade na internet considerada ‘antipolítica governamental’ perderá a sua privacidade e todos os direitos de proteção de dados serão delapidados. Recorde-se que este acordo prevê, igualmente, a verificação na bagagem pessoal dos viajantes dos aeroportos se o computador ou telemóvel contêm ficheiros que não tenham pago direitos de autor”. 
O que o ACTA propõe, diz o Bloco de Esquerda, “é que qualquer pessoa que usufrua, de forma livre e gratuita, de qualquer tipo de informação protegida por direitos de autor na internet, seja criminalmente punido, sendo que a denúncia dos utilizadores é feita pelos próprios operadores privados de comunicações, num verdadeiro atentado à liberdade e à democracia”. 
Alemanha, Chipre, Estónia, Holanda, Letónia, Polónia e República Checa já anunciaram a suspensão da ratificação do Acordo Comercial Anti Contrafacção, sendo que a Eslováquia, que igualmente suspendeu este processo, convocou um debate público sobre a sua adessão ao ACTA.
Os jovens do BE no distrito de Setúbal contestam o processo de censura que o ACTA pretende impor e reclamam ainda o acesso a medicamentos legais que salvam vidas a preços acessíveis. "Não deixes que te esmaguem os direitos" foi o mote do mural.

Paulo Jorge Oliveira 

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