ADN do Amor - Capitulo II

Amor virgem

O que se segue história adentro, são histórias ouvidas que se afastam do seu entendimento pensamentos libidinosos em nome de uma rigidez secular. Foram ouvidas no Bairro Miranda a meio caminho entre o Montijo e a Jardia no ano de 2004. Na altura escrevia como jornalista no jornal Notícias de Montijo. A rúbrica chamava-se Vidas ao Acaso e escrevi sobre dois namorados que queriam chegar virgens ao casamento. É mais um capítulo do ADN do amor... e dos cambiantes  do amor... 



Ela (a Belinha como lhe vou chamar no texto porque não quer se dar a conhecer) é invariavelmente virgem e ele (o Nuno) invariavelmente aprecia que assim seja. “Se gostamos delas aguentamos”, diz.   
No fim-de-semana de todos os namoros, de todos os namorados, uma estória sobre virgindade onde a tradição ainda é o que sempre foi.
Belinha dos olhos verdes uva perguntou um dia ao Nuno de olhos azulinhos, bonitos, se gostava dela. Perguntou-lhe assim mesmo: “Gostas de mim”? Sabe lá onde foi “arranjar a coragem”, recorda, num sorriso largo, “que tremia como varas verdes”. E ele, antes de lhe responder com aqueles olhos bonitos, deu voltas ao coração. “Pensava que o amor dela se situava ao largo, rente a um primo meu”.
Foi num sábado, talvez de sol, talvez de chuva. Foi há um ano, oito meses, e tal. Belinha não sabe dizer os dias porque não se quis dar ao trabalho de contar. Foi um sábado, escrevia, em que ela lhe encostou o coração ao muro depois de conversarem e perceberem se namorariam.
Na terça-feira, provavelmente logo a seguir, assentariam no namoro que se espraia pelos sábados e pelos domingos, semana sim, semana sim, excepto “quando ele está no Norte a trabalhar nas obras de uma estrada”. Aliás, a profissão dele é “estar muitas vezes em grandes obras longe daqui”. Belinha bem se enciúma, – “ai que nervos de ciúme”  –  por o saber longe dos seus olhos verdes uva com outro mulherio a “rondar-lhe a porta, o passo e as calças”. Mas faz confiança nele.
Nuno tem 25 anos, mais dois que ela, presumivelmente, com os mesmos amores e calores que ela. Nunca Belinha lhe perguntou “se ele procurava outras, disponíveis e fácies, para lhe aliviarem as quenturas”. Assim mesmo. Belinha faz confiança nele, no seu “borracinho de olhos azulinhos e bonitos”.

A virgindade

Belinha é virgem e tem “muita honra em sê-lo. A gente vai com aquela da noite de núpcias. Uma noite verdadeira”, conta ela. “Vem a noite verdadeira só que a mulher for inteira”, conta ele com orgulho no seu amor de olhos de uva verde. Já foi assim “com a irmã que agora tem uma pequena de dois anos, foi assim com a minha mãe que nos teve às duas, há de ser assim comigo e com as filhas que um dia hei-de ter. A virgindade tem um significado muito grande. Não há coisa mais bonita que uma mulher guardar-se até ao casamento”. Nuno pensa igual. “Não há satisfação igual à daquele dia. Há sempre tempo para um pouco de sexo depois de ela ser minha mulher. Não há que ter pressa só há que ter amor”.
De fora ficam os desejos carnais (só ainda sonhados) e o namoro é feito de beijos arrebatados, abraços apertados e, claro, muitas juras de amor. Ele, confessa, já “não ser virgem” o que não faz diferença à Belinha porque “o homem tem outras vontades e outras necessidades”. A ela já um tentou: “tinha quinze anos, foi o meu primeiro namoro, e ele, já matulão, andaria pelos dezanove. E foi por isso que acabamos por ele querer mais do que tinha direito”.

Casamento marcado

Antes Belinha “nem pensava nisso”, às tantas queria brincar com bonecas e desviava os olhos quando sentia aproximar um beijo. Agora não, pensa nisso: “no momento quebrantável de um vidro que não voltará a ser como dantes. As dores que não devem ser! Mesmo que ao fim e ao cabo seja uma coisa maravilhosa de que as mais velhas falam. A noite do casamento... ai, nem quero pensar”.
Vão casar em Maio, mês das noivas, na primavera do amor de ambos. Nuno não chega a tirar as mãos dos bolsos. Também ele faz gosto que a “sua Belinha” se guarde para a tal noite de Maio.
Eles brincam com sorrisos cúmplices e ternuras de amor. Belinha ajeita os enormes olhos de uva verde para fazer um reparo final às moças que lêem esta estória de vida: “quando é namoro para durar os rapazes são atenciosos, quando é para gozar querem é aproveitarem-se. E qual é a moça que quer ser gozada?”.
Há amores e namoros assim. Uma forma diferente de amor neste novos tempos nesta semana de todos os namoros e de todos os amores.

Paulo Jorge Oliveira  


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